20 de dezembro de 2009

meio dia e cinco



Mexia-se muito e de forma ritmada, rebelde, independente agora. Não julgava que fosse tão grande. John enrolou-o em três folhas do suplemento internacional do New York Times, a cimeira de Copenhaga não se importaria de ficar um bocado manchada de vermelho. Depois limpou as mãos com o resto do jornal e colocou-o a custo no bolso do casaco xadrez assertoado.

Saiu de casa a toda velocidade, há coisas que têm de ser feitas com a máxima urgência. Existem notícias que simplesmente deveriam ficar para sempre no nevoeiro da ignorância, naquele fumo torrencial que se remexe na boca da fonte. O inferno é sempre a fonte e o que sai dos seus lábios vermelhos.

Já não havia espaço para ele na cidade imensa, no rigor daquele bairro judeu de classe média, no bolso do casaco assertoado de John e na sua vida, no seu peito. Ele pediu para sair. John encorajou-o e encorajou-se. Falou-lhe do futuro, das hipóteses, das estatísticas com odds bem favoráveis e da Primavera que não tardaria. Não foi suficiente.

Depois da decisão tomada julgou que era o primeiro. Mas afinal de contas, são muitos os John’s em Nova Iorque que já o fizeram. Apesar das aulas de boxe na Academia do bairro quando era ainda criança e do gosto por “Onegin” de Pushkin, John não era assim tão diferente. Tinha apenas o defeito de sentir demasiado, como se as vicissitudes da sua história pessoal fossem filmadas em slow motion indefinidamente.

Quando o relógio bateu no meio-dia John parou o carro na ponte e assomou-se do lugar sacramental, sujou novamente as mãos, fez um gesto reverente ao sol de Inverno e observou a corrente forte. Lançou-o convicto.

Ao meio dia e cinco, um coração mais batia no fundo do rio Hudson.

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